Autor (a): Delphine Coulin
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2015
Nº de páginas: 232
Depois de uma árdua jornada que começou no Mali, o imigrante africano Samba desceu do ônibus e se viu, enfim, livre pela primeira vez. Olhou em volta e lá estava ele: Paris, França. Ao caminhar pelas construções antigas, estava radiante. Seus pés estavam cansados e seus sapatos cheios de buracos, mas o céu estava claro, as paredes refletiam luz, e tudo parecia brilhar só para ele. Dez anos depois, seu encantamento com a cidade luz só havia aumentado. Mesmo atrás das grades, mesmo algemado, ele ainda amava a França. Só lhe faltava pensar em um jeito de permanecer — e sobreviver — como um clandestino naquele país.
Antes de ler a sinopse deste livro, pensei: "Ah, não.. Nem muito fã deste estilo musical sou, não vou querer ler isso". Porém, quando li a sinopse descobri uma história intrigante, sem saber que sua leitura se tornaria tão
intrigante quanto.
Nada de música. Samba, na verdade, é um maliano imigrante em Paris - a cidade do amor. Pelo menos, é assim que a maioria de nós à enxergamos dos filmes hollywoodianos. Samba via uma Paris promissora, uma cidade perfeita para se ganhar a vida, só que a vida lhe mostraria muitas coisas ao contrário. Após de fazer dez anos que deixou a mãe e as irmãs e viver ilegalmente em Paris, Samba que sempre pagou os impostos e trabalhou, vai confiante verificar se seu pedido de residência francesa foi aprovado, mas logo após enfrentar uma imensa fila, ele ver sua vida virar de cabeça para baixo.
"Samba" que já ganhou adaptação cinematográfica e que aliás teve o poster do filme como a capa do livro aqui no Brasil, retrata uma história de injúria racial e contra imigrantes. Este é um livro que capta a sensibilidade do leitor e mostra o duro descaso de órgãos governamentais com os imigrantes, que estão apenas interessados em encher os cofres com o dinheiro dos turistas que já ouviram falar da bela e romântica Paris.
É um livro que retrata também a história de outras milhares de pessoas, que saem de seu país de origem para tentar uma vida melhor no exterior, pessoas que entram ilegalmente noutro país e precisam estar a todo tempo evitando complexos policiais, guardas ou até mesmo forjar a própria identidade. Samba é uma desconstrução daquela Paris perfeita e acolhedora, que mostra as ruas além da Champ de Mars, - onde se localiza a Torre Eiffel - revelando o lado obscuro e imperfeito da cidade.
Samba é um personagem forte, marcante, sobrevivente das decepções e que mesmo a tantos "foras" que a vida lhe dá, ainda continua tentando. Mas, por outro lado, ele consegue ser muitas vezes inconveniente, fantasioso e egoísta, aceitando apenas a própria opinião e indo por meios pouco convencionais, numa espécie de vale-tudo. Ele é um anti-herói da realidade, um entre tantos que querem apenas vencer na vida e realizarem seus sonhos.
O livro é narrado em primeira pessoa, mas não por Samba e sim por Alice - uma voluntária de uma associação que defende os imigrantes que estão em situações ilegais. Alice é uma mulher tímida e determinada, cansada das politicagens e da pacatez, é ela que nos conta toda a história de Samba, afim de corroborar ao governo francês que ele merece a cidadania do país.
Delphine Coulin tem uma escrita confortável, fácil e realista... Mas é uma história que merecia chegar a um ápice, só que a autora mantém ela num nível de condução continuo. Mesmo quando surge um trunfo, ele é lançado sem alardes, sem fazer que os sentimentos do leitor aumente ou se compadeça. E isso acabou deixando o livro morno e a leitura das últimas páginas um pouco cansativas.
Todavia, Coulin é autora de uma obra-prima, do retrato dos excluídos, daquelas pessoas que cuidam da cidade, que as mantém funcionando e recebem em troca olhares tortos, como se fossem ratos que ocupam as latas de lixo. Samba é uma tapa na cara da sociedade, um livro sobre problemas sociais, amizade e aventura.
A Companhia das Letras fez um ótimo trabalho de revisão, não me deparei com nenhum erro, seja de ortografia ou digitação. A diagramação também ficou aprazível, letras em bom tamanho com as páginas amareladas.
É um livro que eu indico a qualquer um, pois tem a humanidade em sua essência.